Luís Fernando Veríssimo - O Globo

27/06/2001

 

O outro Santos

 

O Brasil é um país só de homens brancos de ternos escuros. Parece. Você olha a foto do presidente com seu Ministério e não vê uma cara negra. O mais escuro é o próprio presidente. Mulher, então, nem pensar. Podia haver pelo menos uma mulher. Depois que o Pelé saiu do Ministério, abriu vaga para outro grupo exótico.

A escassa representação política do negro brasileiro é um desmentido, entre tantos outros, da nossa democracia racial. O alto grau de miscigenação e o convívio relativamente ameno das raças provariam que por aqui há pouco racismo, mas o racismo não tem nada a ver com isto. Tem a ver com direitos, com a fria matemática das oportunidades iguais. Continuam pouquíssimos os negros brasileiros que conseguem vencer este preconceito escondido - que é mais perverso porque nem se conhece - e aparecer por outro caminho que não seja o do Pelé ou da arte popular.

Não sei se o Jaguar já publicou esta história que nos contou. Entrou numa livraria para comprar um livro do geógrafo Milton Santos, que morreu há dias e era um dos intelectuais negros brasileiros mais conhecidos no exterior. Foi dirigido para a seção de livros de esporte. Lá certamente encontraria a autobiografia do Nilton Santos, glória botafoguense.

   Nilton Santos não, disse Jaguar. Milton Santos.

   Quem?

   Por acaso, Jaguar tinha uma revista com uma foto do geógrafo.

   Este aqui.

   Depois de examinar a foto, o funcionário da livraria comentou:

   Mas esse não é o Nilton Santos.

   Claro que não é - disse o Jaguar.

   É o Djalma Santos.

 

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