Reestruturação Produtiva no Paraná*

 

Zeno Soares Crocetti*

 

Resumo

Esta exposição propõe debater as posições teóricas e experiências concretas a respeito do papel das políticas neoliberais na reconfiguração do território paranaense.Pretendemos analisar o impacto dessas políticas nas várias regiões paranaenses, bem como medir a concentração econômica na RMC, fruto da "Nova (re) territorialização do Paraná", dentro da lógica neoliberal de interferência global, e denunciar essa subordinação e integração a esse modelo de projeto desenvolvimentista de Estado. Nesse campo de incertezas e de contradições, iremos 

espacializar e identificar os espaços marginais  ou de 

resistências a integração e a flexibilização.

Palavras chave: a) território, b) globalização, c)neoliberalismo, d) geopolítica, e) poder.

 

Nota: Este trabalho dá seguimento à pesquisa apresentada no XIV Congresso Estadual do PT-Paraná, em Curitiba, maio de 1997, e depois publicado na Revista Paranaense de Geografia n.º 2, Curitiba, julho de 1997, com o título Globalização, Tecnologia, Neoliberalismo e Poder e encaminhado ao Congresso Nacional de Professores de Geografia do Uruguai, Montevidéu, 17 a 20 de setembro de 1997.

O presente texto aumentado, foi preparado para a 13ª SEMAGEO (AGB-Curitiba, 5 a 8 de junho de 2000) resume os outros textos e inclui material novo e análise de conjuntura.

 

 Introdução

 

“(...) Em nome do globalitarismo racional, vão sendo atacadas formas conhecidas e tradicionais de solidariedade. Todas são transformadas na mesma peste: o corporativismo egoísta. O sucateamento dos patrimônios públicos, a destruição dos direitos sociais e dos salários, a precarização das relações de trabalho e o corte dos gastos públicos, sobretudo na área social, são medidas políticas sempre consideradas insuficientes frente ao apetite do centro do capitalismo.”

                                                                                                                   [ Fiori, 1999, pp.57.]

 

O Paraná vai montando seu parque industrial, aos pouco, e em pouco tempo o perfil do Estado será outro. Cerca de 24 bilhões de dólares foram e serão investidos entre 1996 e 2002, e nos próximos anos existem promessas de mais investimentos.

Para atrair esses investimentos o Paraná se valeu de sua posição estratégica em relação aos países do MERCOSUL, sua infra-estrutura (rodovias, ferrovias, porto próximo à capital, aeroporto internacional, telefonia, energia), disponibilidade de mão de obra e qualidade de vida.

Mais o principal motivo que esta atraindo investimentos ao Paraná são as isenções fiscais, linhas de crédito subsidiadas e infra-estrutura privilegiada (com terraplanagem, construção de estradas de acesso, fornecimento de linhões de transmissão de energia, rede d’água, esgotos – pluviais, industriais e sanitários – e as linhas telefônicas), claro que tudo isso aliado a isenção e dilações de impostos municipais e estaduais, como IPTU e ICM. Aqui temos um bom exemplo de como o capital estrangeiro encontra no Brasil uma legislação privilegiada que não coloca restrições e nem regulações, só favorecimento a sua entrada, e não dispõem e nem prevê compensação ao capital nacional aqui instalado.

Dois grupos de indústrias vieram para o Estado. No primeiro grupo estão as montadoras de veículos e, como conseqüência, as fábricas de autopeças, que estão se estabelecendo nos municípios próximos à capital. No segundo grupo estão as indústrias que garantem a diversificação da produção e se espalharam por várias regiões do Estado, como as fábricas de laticínios, congelados, bebidas, papéis, madeira, refrigerantes, sucos, café, tecidos, embalagens etc.

 O modelo

A variante neoliberal no Brasil (assim como na América Latina), consiste de algo diferente dos modelos Japonês, Europeu e Estadunidense. Nos Estados Unidos, o próprio Estado de bem-estar social contou com uma grande rede de empresas privadas, que complementavam os serviços públicos. No Japão, o grosso do atendimento da população, quanto aos bens sociais, sempre foram feito por empresas privadas. Em ambos os países, constituem uma tradição, dispor de um conjunto de empresas privadas para atender o público, dos bens sociais no varejo. Na Europa, com exceção da Inglaterra, que desenvolveu um modelo semelhante ao dos Estados Unidos, a Alemanha e a Itália apostaram nos serviços cooperativos e os outros países da Europa, de um modo geral, construíram  o seu modelo de Estado de bem-estar a partir da ação da social democracia, os bens sociais foram desmercantilizados com uma forte oferta pública e praticamente inexistindo empresas de atuação no setor de varejos.

O Brasil está construindo o seu projeto neoliberal, iniciado no governo Collor e aprofundado no governo Fernando Henrique Cardoso, dentro de um projeto de construção de um centro dinâmico para a economia brasileira, só que agora num contexto de globalização – parece que FHC não abandonou a sua perspectiva de “autonomia na dependência” –, o que implica na criação de um sistema de financiamento interno que estimularia um conjunto de atividades econômicas voltadas para o varejo e o estimulo a competição em algumas áreas no plano internacional. Os bens sociais no Brasil, mesmo quando oferecidos pelo Estado, o é em estreita parceria com a iniciativa privada - os fornecedores são na grande maioria privados (de livros didáticos a remédios) e já ocupam os maiores filões de renda (tanto escolas privadas como hospitais privados).

A Nova Ordem Mundial se sustenta nas velhas desigualdades entre os habitantes, assim como nas velhas distinções entre classes de países. Os caciques da aldeia global são os 23 países desenvolvidos, que concentram nada menos que 80% do Produto Interno Bruto (PIB) do globo, US $ 20,5 trilhões, mas onde moram apenas 15% da população: Estados Unidos, Canadá, países da Europa Ocidental, Austrália, Japão e Nova Zelândia. Neste grupo exclusivo, a renda per capita média é US $ 24 mil. Nos outros 162 países, US $ 1 mil.

"É fácil de constatar as disparidades, basta dar uma volta nas ruas", disse o cientista político e lingüista estadunidense Noam Chomsky, ao visitar em novembro de 1998, pela primeira vez o Brasil. Diariamente, circulam US $ 3 trilhões nos mercados financeiros mundiais. Diariamente também, um quarto dos habitantes do planeta vai dormir com fome, o que corresponde a cinco vezes a população dos Estados Unidos.

Há cada vez menos barreiras para o percurso do capital. O volume de comércio exterior, base da internacionalização econômica, cresceu em média 5,3% nos quatro primeiros anos da década de 90, o maior avanço desde o início dos anos 70. Não houve, porém, contrapartida no aumento da riqueza mundial. Ao contrário: a taxa de crescimento do Produto Interno Bruto nos anos 90 foi a mais baixa da segunda metade do século 20, 1,71% ao ano em média, segundo mostra um estudo do economista Simão Silber, professor de Economia da USP. A conclusão é que a intensificação da circulação de mercadorias entre os países, uma marca do globalitarismo, não tem melhorado a vida da maioria das pessoas nem tampouco da maior parte dos países. O capital circula com mais velocidade, mas a quantidade de produtos continua praticamente a mesma, ou seja, maior produção com menos trabalho, logo menos consumo.

Para os países candidatos ao modelo nessa guerra global, reza o manual globalitário que é necessário satisfazer cinco condições:

 Para a implantação do projeto da nova ordem mundial (o globalitarismo) o Estado nacional – como o conhecemos hoje – deve ser eliminado. A coordenação das políticas macroeconômica passa para os cartéis (megaempresas globais) ou organismos internacionais (FMI/Banco Mundial/OMC). Os serviços públicos devem ser privatizados para se adaptar as estratégias globais. O Estado Mínimo passa a ser então sinônimo de legislação e ainda assim basicamente na área civil, pois as de ordem econômica e trabalhista devem ser padronizadas e flexibilizadas – a formação da União Européia expressa claramente esta perspectiva. E também deve se organizar, assumindo total responsabilidade para que os excluídos não perturbem os incluídos na “nova ordem”, garantindo a estes ordem e segurança que a produtividade/ qualidade/racionalidade requerem. Hoje se fala em políticas compensatórias para diminuir os impactos dessa política globalitária excludente e gestora da pobreza, fruto dos ajustes estruturais em curso para adaptar as economias locais a lógica da nova dinâmica da economia mundial.

 Investimentos externos

Levantamento da secretaria de Industria e comercio e Desenvolvimento Econômico do Paraná (SEID), indicam que nos últimos cinco anos (1995-2000) o Paraná, recebeu investimentos diretos – instalação de novas unidades ou expansão da capacidade produtiva – da ordem de U$ 23,5 bilhões. Deste total, 20% são das montadoras em torno de 5 bilhões U$. Levantamento feito pela secretaria aponta um crescimento de 191% entre 1990/95. Investimentos feitos no MERCOSUL saltaram de 1.1 para 5,2 Bilhões US $. O governo paranaense finalizou no início de 1999 a conclusão do anel de integração, também chamado de sistema multimodal, ou seja, integração de aeroportos, portos fluviais, hidrovias, portos marítimos, rodovias e ferrovia, sendo que a Ferroeste é uma das poucas ferrovias transversais existente no país, pois como estratégia permitirá a ligação entre os Oceanos Atlântico e Pacífico. Outro fator geoestratégico é o gasoduto Brasil/Bolívia, que passa pelo Paraná, o que poderá favorecer a criação de um pólo de alta tecnologia em Campo Largo, amplamente divulgado pelo governo, o que vai permitir a construção de um pólo de supercondutores de cerâmica.

Investimentos no Paraná 1995-2000

Setor

Valor milhões de US $

Serviços públicos

7.007,60

Transporte e armazenagem

4.757,80

Mercado Financeiro

3.567,00

Autopeças e montadoras

3.104,40

Metalurgia/Têxtil/Bebidas

1.395,95

Madeira/Móveis/Papel

1.150,00

Alimentos

936,30

Petroquímica/Construção

573,60

Eletroeletrônica/informática

431,50

Outras

229,20

Total Geral

23.153,35

Fonte: IPARDES, IBGE e Gazeta Mercantil, 2000.

Concentração dos investimentos na RMC

Análise Conjuntural do IPARDES comprovou com dados reais, que apontam que 70% dos investimentos feitos no Paraná ficam na Grande Curitiba.

Dos investimentos listados pelo IPARDES, o maior é na área metal-mecânica com 3,649 bilhões $ US, e o de material de transportes, com 3,029 bilhões $ US. O material de transportes é 100% da RMC, conforme o estudo, e o metal-mecânica mais de 90% também.  Já o investimento agro-industrial, de quase 1 bilhões $ US (para ser exato $ 987,3 milhões), tem a drenagem de 80,48% para o interior. Nesse caso, urge não esquecer que no eixo Curitiba/Ponta Grossa está o maior parque de oleaginosas da América Latina. Há um adicional nesse trabalho, que alcança 4,753 bilhões $ US, que trata de inversões privadas diretamente ligadas à produção. Esses totais excluem programações de investimentos em infra-estrutura de energia elétrica, telecomunicações, transportes e distribuição de petróleo que no conjunto superam 4 bilhões $ US.  Ficaram de fora também algumas intenções de investimento de longo prazo manifestadas pela Renault, Klabin e Electrolux, totalizando quase 1 bilhões $ US. Somando tudo, dá os 12 bilhões $ US, que, segundo Lerner, vão gerar 180 mil empregos. O quadro a que nos referimos é do setor industrial porque a expressão da agricultura e do extrativismo (setor primário) é de pouco significado no conjunto metropolitano e zerada em Curitiba. Juntem a isso o potencial do setor terciário (comércio, transportes, serviços), que são mais agregadores ainda de capital e trabalho e teremos idéia ainda mais forte do desequilíbrio.

O Paraná só será uma unidade integrada e forte se houver não apenas distribuição mais equilibrada desses investimentos, mas uma ação mais coordenada pela difusão do bem-estar.

Reproduzir o modelo paulista, não provará racionalidade e inteligência de nossa parte e muito menos confirmará a expectativa de todo o país na proclamada criatividade do nosso governador. Ganhamos, no entanto, num aspecto: tiramos de nossa economia a condição de complementaridade da paulista.

 

 RMC em 1998, fonte IAP/ITCF.

 Recentemente saiu uma publicação sobre o PIB (Produto Interno Bruto) estadual e que reafirma a concentração da economia na Grande Curitiba: 22% do total estão justamente ali. Antes houve aquela outra revelação, num estudo sobre potencial de consumo: a capital paranaense detinha 24% de tudo, o que se consumia no sul do país, isso torna a situação mais perversa, já que em Santa Catarina, Joinville saia à frente com 9%, seguido de Floripa com 8%, o que indica uma irradiação mais distributiva. Também a distância entre Curitiba e Londrina era maior do que a estabelecida entre Porto Alegre e Caxias do Sul: a ex-capital do café aparecia com 5%.

A partilha do ICMS, em que a Grande Curitiba aparece com quase dois terços. Não é para espantar, já que os fatores locacionais, que pesam hoje na escolha das montadoras, são visíveis no agregado da Cidade Industrial acoplada ao distrito fabril de Araucária, onde opera ainda o pólo petroquímico. Araucária e São José dos Pinhais ficam com uma parte ponderável das rendas públicas.

Vamos novamente ao estudo do IPARDES sobre o ‘‘Perfil dos Investimentos Industriais no Paraná’’. Há três gêneros em que o interior sobrepuja a Região Metropolitana: a agroindústria (80,48% contra 19,52%), madeira/mobiliário (90,48%) e bebidas (75,68%). Há um equilibrado, levemente beneficiando o interior: produtos de matérias plásticas (51,72% dos investimentos). Há os de 100% na RMC como minerais não metálicos, material de transportes, perfumaria e gráfica. Vejamos os demais: material elétrico e de comunicações (96,75% na RMC), mecânica (95,38%), metalurgia (88,89%), química (86,25%).

O IBGE, com a sua neutralidade numérica, vem mostrando que estamos na véspera do caos com um cinturão de miséria envolvendo cada uma das cidades da região metropolitana de Curitiba.

O ponto relevante é que, nos últimos anos, o capital industrial ganhou enorme mobilidade. Com os níveis de automação atuais, é possível transferir fábricas de um ponto a outro do país em um piscar de olhos. Se um Estado atrai determinada empresa com incentivos fiscais, no momento em que cessarem os incentivos, ou Estados competidores igualarem as condições oferecidas, a empresa simplesmente abandonará o Estado inicial.

 Historicidade territorial

 

“O espaço é anterior ao território. O território se forma a partir do espaço, 

é o resultado de uma ação conduzida por um ator

 (que realiza um programa). Ao se apropriar de um espaço, 

concreta ou abstratamente (pela representação, por exemplo) 

o ator ”territorializa” o espaço.”

[Raffestin, 1993, p. 143 ]

 

Os governos Moisés Lupion (1947-50) e Bento Munhoz da Rocha Netto (1950-55), visaram construir um Paraná único a partir da imigração, garantindo a sua ocupação espacial e posteriormente um complexo viário que rumasse a Curitiba, onde o Centro Cívico funcionasse como referência de governo, mas fundamentalmente de identidade para o povo paranaense que se queria modelar a partir dos valores de progresso pelo trabalho e ordem pelo patriotismo.

Os Governos Nei Braga (1961-65) e Paulo Pimentel (1966-70), vivendo o auge do Regime Militar e do “milagre brasileiro”, pensaram o desenvolvimento do Paraná a partir da necessidade da industrialização. Investiriam e incentivaram a formação de diversos parques industriais em diversos municípios e em todas as regiões do Estado.

O Governo Jayme Canet (1975-79) e Nei Braga (1979-82) promoveram o reforço da estrutura estatal particularmente no setor financeiro e serviços públicos para o Paraná, que acreditavam desenvolvido. Tratava-se apenas de dar suporte ao crescimento econômico que parecia inercial.

Os Governos do PMDB (José Richa 1983-86, Álvaro Dias 1987-90 e Roberto Requião 1991-94), mergulhados na crise econômica dos anos 80, propunham-se a construir um novo modelo de desenvolvimento baseado no crescimento do capital nacional e com forte aporte dos investimentos estatais. Imaginavam-se acima dos problemas sociais e, portanto, caberia às políticas publicas governamentais, geradas em seus gabinetes, as soluções para todos os tipos de problemas.

 Uma nova territorialização do Paraná

O Governo Jaime Lerner/PFL 1995-2002 vem implementando uma nova mudança, uma nova reestruturação econômica. O Paraná não é mais visto como um único espaço ou território, mas como regiões com vocações particulares e distintas dentro do processo de globalização. Lerner e seu grupo político, partidários da dinâmica da globalização econômica, estão investindo pesado numa nova espacialização/territorialização do Estado, visando uma integração rápida, nesse modelo de pensamento único do Mercado Nacional e Internacional.

 

 Região 1: Região Metropolitana de Curitiba:

Busca vender uma imagem de povo “culto”, de cidade funcional e de mão-de-obra qualificada para atrair setores dinâmicos da economia brasileira e internacional. Está localizada numa posição geográfica privilegiada, entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina e o Sudeste, situando-se ainda no centro do principal potencial econômico do MERCOSUL. Possuem uma boa ligação rodoviária e portuária e boa condições de infra-estrutura urbana. Dificilmente se transformará num pólo financeiro ou de produção tecnológica, mas na produção de produtos de utilização intensiva de mão-de-obra e de maior valor de troca. Os setores preferidos são os de alta tecnologia (portanto de produção de componentes e não apenas de montagem de produtos). Esta região tem potencial para se expandir até Paranaguá e Ponta Grossa.

 

 Região 2: Eixo Maringá / Londrina:

Voltando-se para a agroindústria e indústria mecânica, indústrias leves — Couro, móveis, e têxtil — e possivelmente de montagem de produtos eletrônicos e similares. O Potencial populacional da região; com um poder aquisitivo razoável, permite o desenvolvimento de um forte núcleo de serviços, comercio e micro-empresas.

 

 

1

 

 

Mapa na regionalização do Paraná pós 1995, gestão Lerner (1995-2002).

Região 3: A Costa Oeste:

A região de Foz do Iguaçu deve desenvolver a atividade turística, neste sentido, o Governo Lerner procura diversificar o potencial de atração — hoje restrito às Cataratas, reuniões científicas e empresariais, e as compras no Paraguai — para aberturas de novas áreas de turismo (como a pesca e parques), novas atividades, como jogos, festivais e provavelmente o estabelecimento de cassinos e uma zona franca.

 

Região 4: Costa Leste:

Vem estimulando o turismo através da melhoria da infra-estrutura das praias do Paraná. A grande incógnita esta no Porto de Paranaguá, em cuja operacionalização Lerner ainda não investiu de maneira decisiva, talvez em função dos revezes políticos sofridos por seu grupo no município de Paranaguá.

As demais regiões do Estado estão seguindo seus caminhos independentes, sem um apoio decisivo do governo. São as regiões que “saem perdendo”.

 

 Região 5: Região do Norte do Paraná: (excluído o eixo Maringá/Londrina).

De forma geral, tem-se caminhado levando-se em conta perspectivas locais como áreas de latifúndio ou minifúndio. O comércio tende a se refletir em maior ou menor intensidade em função da proporção do tamanho das propriedades rurais e da densidade populacional. O setor público mantém um grande número de assalariados, que, em algumas pequenas cidades, praticamente sustentam a economia local. Outras regiões, como o Norte Pioneiro têm perdido população.

 

 Região 6: Regiões Oeste /Sudoeste do Estado:

Com uma economia de pequenas indústrias e pólo comercial regional em algumas grandes cidades, esta região assenta a produção a partir da agropecuária intensiva — seja nos latifúndios ou nos minifúndios. Nos minifúndios, esta forma de produção foi possível graças à terceirização rural, promovida pelas indústrias do frango de Santa Catarina ou do fumo do Rio Grande do Sul. Esta forma de produzir tem deslocado a poupança regional para SC ou RS, com a falência das cooperativas e grandes agroindústrias locais.

 

Região 7: O Centro e o Sul do Paraná:

Situação similar à região Oeste / Sudoeste, mas com pouco investimento da terceirização rural, com a agravante de que a bacia leiteira vem sofrendo um forte impacto da concorrência dos produtos argentinos, uruguaios e gaúchos.

Nas regiões cinco e sete seriam necessários investimentos estatais para reconversão econômica, como requalificação da mão-de-obra e a formação de mecanismo captadores e retentores de capital. Mas o Governo Lerner não possui nenhuma política para isto. A região seis está efetivamente se integrando à região econômica do Oeste de SC e Norte do RS, o que estimulará ainda mais — e agora com razão econômica — a formação do Estado do Iguaçu.

 

As estratégias fatais

 

“O que eu penso entender por uma revolução neoliberal não é uma revolução na qual a classe dominante faz a luta – eles nunca fizeram isso em nenhuma revolução – mas uma revolução cuja ocorrência limpa o terreno para a dominação do globalitarismo”.

[Crocetti, 1997, p.36]

 

Sendo assim, Lerner constrói uma variante distinta de FHC: o da competência dentro da globalização. A diferença fundamental entre o modelo de Estado de FHC está no seguinte:

 

Fase 1: Os serviços públicos estão sendo sucateados através de cortes sistemáticos de recursos e ações que desmotivam e desqualificam do funcionalismo, geralmente através de gestões burocráticas e pela perda do poder aquisitivo de seus salários. Essa política vem sendo implementada, desde o Governo Álvaro Dias.

Fase 2: Diante da crise gestada pela própria administração pública, o Governo Lerner executa três ações políticas:

 

Œ – abandona ou transfere parte dos serviços públicos para os municípios ou iniciativa privada;

– reduzem mais custos a partir de técnicas de gestão empresarial (reestruturação política e reengenharia e QT), arrocho salarial e redução do quadro de pessoal; e

Ž – propõe parceria com o empresariado ou terceirização.

 

Fase 3: Transferência total para a iniciativa privada (privatização) dos serviços de varejo do Estado.

 

No plano econômico o modelo de Lerner se altera em relação aos governos passados. Os governos do PMDB, bem ou mal, orientavam-se por uma política intervencionista, que propunha uma visão global de Estado e um modelo de desenvolvimento que desse suporte a diversidade econômica das diversas regiões como o apoio direto aos diferentes segmentos de renda. O governo Lerner propõe que o estimulo estatal se volte para os setores definidos e determinados pelo mercado. Ou seja: O centro orientador dos investimentos estatais não é mais definido pelo planejamento de conjunto do Estado e nem pela capacidade política das lideranças regionais, mas pela as determinações do mercado globalizado e nacional em vias de globalização.

 

Três são as ações possíveis de Lerner para implementar este modelo:

 

Ponto 1: Construir a imagem de uma região viável economicamente e vendê-la.

Assim com fez com Curitiba, e parece ser possível mostrar aos grandes investidores que o Paraná, não é só uma boa imagem, mas também dispõem de vantagens competitivas, tais como; sua posição estratégica frente ao MERCOSUL, além dos incentivos de infra-estrutura competitiva, incentivos fiscais e financeiros de parceria e sócio como no caso da Renault. Neste sentido procura uma rápida reestruturação do Estado e algumas políticas de efeito moral: O Paraná que está dando certo, por exemplo.

O principal projeto é o Paraná Urbano, que atua na área social que aponta para um dividendo eleitoral, mas o privilegiando ainda é o setor de produtivo e Infra-estrutura. Este projeto financiado pelo BID, segundo o próprio governo do Estado “[...] destina-se a proporcionar investimentos ao setor produtivo e apoio à população de baixa renda na área de saúde, educação e assistência social”. Também é importante neste as transformações na educação  (visando a rápida promoção dos alunos pela rede escolar) e nas rodovias (com a concessão privada e o anel de integração).

 

Ponto 2: Construir um sistema de fomento capaz de estimular as ancoras determinadas pelo mercado.

O Governo Lerner vem construindo um conjunto de incentivos fiscais, que a partir da Lei Aníbal Curi, e principalmente através do Programa Paraná Mais Emprego, promove o ICM incremental com a dilatação do prazo de pagamento, além de dilações fiscais. Mas há ainda um conjunto de procedimentos para o estimulo local ou setorial de investimento, algumas vezes em conjunto com as prefeituras.

Apenas os incentivos fiscais não garantem a vinda de empresas em função da “guerra fiscal em curso”. Dessa maneira, o governo do Paraná instituiu o Centro Internacional de Negócios (CIN), em parceria com o BANESTADO, SEID e o SEBRAE-PR, visando a integração com agentes econômicos (públicos e estatais) do Brasil e internacionais, materializando essas políticas em três empresas; o Instituto Paraná Desenvolvimento (IPD), a Paraná Investimentos e a Agência de Desenvolvimento do Paraná.

A Agência de Desenvolvimento do Paraná, empresa de capital fechado, com objetivo de captação de recursos públicos para investimento em bens de capital fixo. Tendo em sua fonte de recursos, o Fundo de Desenvolvimento Econômico (FDE), cuja carteira é formada por royalty e recursos provindos da União, principalmente do BNDS.

A Paraná Desenvolvimento, empresa de capital aberto, com o controle de 51% do capital pela Agência de Desenvolvimento do Paraná. Tem por objetivo a captação de recursos no mercado para financiar projetos de infra-estrutura (telecomunicações, energia, transporte e turismo) a se viabilizam através da parceira com o Estado, e com a iniciativa privada. Esta empresa também poderá promover a participação societária temporária, para viabilizar a implantação de novos investimentos no Paraná, como foi o caso da Renault.

A Paraná Investimentos, é uma empresa lastreada pelas debêntures da COPEL, da Ferroeste e da SANEPAR, para garantir investimentos em empresas públicas e privadas, além de garantir e assegurar a contrapartida e infra-estrutura de organismos multilaterais, tais como o BIRD e o BID, por exemplo. O objetivo parece ser a preparação para a privatização das grandes empresas estatais sobre o controle do Governo do Paraná.

Neste quadro, foi restringida a ação do BANESTADO, que num passe de mágica, foi transformado em Banco Comercial pronto para a privatização, sem constrangimentos, e o que é pior para os críticos da privatização, acabou deixando-os sem argumentos contra a privatização.

 

A ação do Governo estadual é critica em dois aspectos:

 

Œ – ausência de políticas públicas para todas as regiões do estado, que visem superar os desafios na mudança do modelo de acumulação capitalista. Afinal os governos devem investir não apenas em regiões rentáveis, mas também naquelas que se encontram em dificuldade de desenvolvimento, justamente para reduzir as desigualdades sociais, além de promover a integração do estado como um todo;

  – falta de um projeto social objetivo, que pense não apenas em número de empregos, ou no montante financeiro, lembrando, por exemplo, a necessidade de mecanismo de distribuição de renda e seguridade social, neste caso também vale lembrar a necessidade de investimentos em áreas de maior desemprego ou pobreza bem como em pequenas e micro-empresas e pequenos propriedades familiares rurais. Por último é importante garantir que os processo de parceria ou de sociedade não tenha por meta privilegiar grandes grupos econômicos que apóiam o governo do Estado, ou financiaram sua campanha política.

Nos projetos que criaram e constituíram estes organismos de fomento, deveriam conter emendas reservando parte do orçamento para pequenos e microempresários, para pequenas propriedades familiares rurais e para regiões pobres do Paraná.

 Ponto 3: Construir uma base para a ação da iniciativa privada no varejo dos bens sociais.

O governo tem tido dificuldade para constituir a base de transferência para a iniciativa privada dos mecanismos de varejo dos bens sociais. Uma vez que o principal filão já é ocupado pela iniciativa privada. Lerner iniciou um ambicioso projeto na Rede Estadual de Ensino que fracassou profundamente. Inicialmente propôs através dos CREDE – Conselhos Regionais de Desenvolvimento Educacional –, a participação empresarial, com autonomia até para mudanças curriculares e esperando uma reconversão das escolas as realidades regionais com um aporte de investimentos em contrapartida. O resultado desta iniciativa é nulo. Os empresários paranaenses não estão dispostos a investir em educação geral. Ainda para tentar viabilizar esse processo lançou o Banco Escolar, onde os gerentes do BANESTADO ficariam encarregados de arregimentar empresários – clientes para financiar uma escola de sua cidade. O resultado, novamente foi praticamente nulo, resultou apenas em práticas clientelistas (imagino que empresários se ofereceram muito mais com a intenção e desejo de receber favores da gerência, do que efetivamente contribuir com o estado para o avanço dessas políticas públicas, ou quem pode até ter ocorrido algum contratado por iniciativa de gerentes que desejavam mostrar serviço). Por último, as ações do governo se restringiram ao projeto do deputado Algaci Túlio, que cede os espaços nas Escolas Públicas para a comercialização de propaganda.

Os projeto mais ousado tem sido as parcerias com empresas privadas, no ensino técnico, para formação profissional e técnica adequada, onde as empresas entram apenas com professores, além é claro das parcerias com iniciativa privada, na chamada Universidade do Professor, em Faxinal do Céu, onde os serviços de capacitação foram terceirizados para requalificação dos professores da rede pública.

Agora o governo investe pesado na transferência dos equipamentos da rede de saúde para as prefeituras, onde poderão ser implementadas políticas de terceirização, como a PAS da Prefeitura de São Paulo, ou ainda, poderá buscar parcerias nos grandes postos de saúde e hospitais públicos junto as empresas de planos de Saúde, como já vem ocorrendo em Ponta Grossa.

 Referências

 1.      ANDERSON, Perry. Balanço do Neoliberalismo. In: SADER, Emir & GENTILE, Pablo (org.). Pós neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. pp. 09-23.

2.      BENKO, Georges. Organização econômica do território: algumas reflexões sobre a evolução no século XX. In: SANTOS, Milton et. all (org.). Território globalização e Fragmentação. São Paulo-SP: HUCITEC, 1995. pp. 51-71.

3.      CORDIOLLI, Marcos. O Estado de bem-estar e os neoliberais. São Paulo: PUC/SP, 1996.

4.      CORDIOLLI, Marcos. Discutindo a Transição do Modo de Acumulação Capitalista. Curitiba-PR, 1997, inédito fotocopiado.

5.      CHOMSKY, Noam. Os Caminhos do Poder. Porto Alegre-RS: ArtMed, 1998.

6.      CROCETTI, Zeno Soares. Globalização, tecnologia, neoliberalismo e poder. Curitiba-PR: Revista Paranaense de Geografia n.º 02, pp. 31-39. Editora: Letra das Artes, 1997.

7.      FERNANDES, Luís. Neoliberalismo e reestruturação produtiva. In: SADER, Emir & GENTILE, Pablo (org.). Pós neoliberalismo: as políticas sociais e o Estado democrático. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1995. pp. 54-61.

8.      FIORI, José Luís. Estados e moedas no desenvolvimento das nações. Petrópolis-RJ: Vozes, 1999.

9.      HARVEY, David. A condição pós-moderna. Uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. 4ª ed. São Paulo: Loyola, 1994.

10.  IANNI, Octavio. A era do Globalismo. 2ª edição. Rio de Janeiro-RJ: Civilização Brasileira, 1997.

11.  IPARDES. Fundação Edson Vieira. O Paraná Reinventado: política e governo. Curitiba, 1989.

12.  IPARDES. Paraná para investidores. www.ipardes.gov.br/projetos/prinvest/port/home.html, 1998.

13.  LOURENÇO, Gilmar. Atração de empresas e concentração industrial no Paraná. Análise Conjuntural, v. 18, n.11-12, p.3, nov./dez.1996.

14.  MAMIGONIAN, Armen. Marxismo e “Globalização”: As origens da Internacionalização Mundial. In: SOUZA, Álvaro José de et. all (org.). Milton Santos Cidadania e Globalização. Bauru-SP: Saraiva, 2000. pp. 95-100.

15.  RAFFESTIN, Claude. Por uma Geografia do Poder. São Paulo, Editora Ática, 1993, 269p.

16.  SANTOS, Milton. O retorno do Território. In: SANTOS, Milton et. all (org.). Território globalização e Fragmentação. São Paulo-SP: HUCITEC, 1995. pp. 15-20.

17.  SANTOS, Milton. Por Uma Outra Globalização: do pensamento único à consciência universal. Rio de Janeiro-RJ: Record, 2000.

18.  SODRÉ, Nelson Werneck. A Farsa do Neoliberalismo. 5ª edição. Rio de Janeiro-RJ: Graphia, 1998.

19.  SOROS, George. A crise do Capitalismo: as ameaças aos valores democráticos : Rio de Janeiro-RJ, 3ª edição, Editora: Campus, 1999.

20.   THOMPSON, E. P. A miséria da teoria. Rio de Janeiro: Zahar, 1981.


* Professor de Geografia em Curitiba na UNIBEM e Anglo/Bittar, Correio Eletrônico: crocetti@uol.com.br.


 *Texto publicado nos anais  da 13ª Semana do Geógrafo da UFPR, Vol.1 –Ano1 –2001 p.73-93. Edições AGB.

voltar ao topo             voltar aos textos